Just a fool
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.De que matéria é feito um álbum capaz de roçar a perfeição? Não faço a mínima. Sente-se apenas que o é. E em relação a um bom álbum? Se pudesse fugir à questão e responder com um exemplo, aconselharia, para já: o "Frantic" (2002) do Bryan Ferry. E se calhar não pensaria mais no assunto, confiante que audição após audição também nele encontrariam argumentos de peso. À primeira audição descartei logo a hipótese de vir a gostar dele. Soava-me demasiado pop. Continua a soar, mas já lido bem com isso. Descobri-o há uns tempos e de cada vez que o ouço fico de ressaca. A culpa é sobretudo das letras. Acho que só vou falar delas, tocá-las de raspão, para fazerem uma ideia. Deixo o som para outras esferas do entendimento. Podia resumi-las assim: ao longo das suas treze faixas, revisita-se com grande fulgor o clássico dos clássicos: o sofrer por amor. Há quem sabiamente lhe chame o eterno problema. Apanham-se aqui e acolá farpas doridas, confissões que vertem mágoa. Lamenta-se-lhe a falta, a desilusão face aos destinos que se cruzam e que depois se afastam. Fala-se do amor que cega, do orgulho ferido, da ingenuidade perdida, da metáfora do rei-sábio que talvez caia do pedestal (em "A Fool For Love"). Há o sofrer desesperado pela não correspondência, com alusões vagamente chantagistas ao recurso final - o bálsamo de morfina, caso ela não... (em "Goodnight Irene"). As vozes quase etéreas do refrão "Hiroshima...", que talvez não me importaria de incluir na banda-sonora do filme de Alain Resnais. A cadeira vazia junto à lareira, onde se costumava sentar a amada, o silent reminder, a ausência que ocupando todos os meandros do pensamento se faz presença; o inevitável processo de recordar, a sua evocação no elencar exaustivo de objectos (em "San Simeon"). As lágrimas derramadas por via de um amor de sentido único, o cansaço que daí advém, o querer partir para outra, cedendo ao natural anseio por amor retribuído (em "One Way Love"). O assumir das ilusões perdidas, o regresso desencantado a si depois do sonho (em "I thought"). Falei das letras, mas disse pouco. É que só se revelam plenamente quando conjugadas com a música. E com música quebrei o meu voto de silêncio.
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3 Comentários:
this charming man...
this charming music... :)
too ;)
gosto muito da musica "same old scene"
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