domingo, julho 30, 2006
Definições idiossincráticas:
O amor não escolhe idades
The Arcade Fire "Neighborhood #3 (Power Out)"
. . Neighborhood #3 (Power Out) .
I woke up with the power out,
not really something to shout about.
Ice has covered up my parents hands,
don't have any dreams don't have any plans.
I went out into the night,
I went out to find some light.
Kids are swingin' from the power lines,
nobody's home, so nobody minds.
I woke up on the darkest night,
neighbors all were shoutin' that they found the light.
(We found the light)
Shadows jumpin' all over the walls
some of them big, some of them small.
I went out into the night.
I went out to pick a fight with anyone.
Light a candle for the kids,
Jesus Christ don't keep it hid!
Woohoo! Woohoo! Woohoo! Ice has covered up my parents hands,
don't have any dreams, don't have any plans.
Growin' up in some strange storm,
nobody's cold, nobody's warm.
I went out into the night,
I went out to find some light.
Kids are dyin' out in the snow,
look at them go, look at them go!
Woohoo!(3x) WOO! Woohoo!(3x)
And the power's out in the heart of man,
take it from your heart put in your hand. (hand)
What's the plan? What's the plan?
Is it a dream? Is it a lie?
I think I'll let you decide.
Just light a candle for the kids,
Jesus Christ don't keep it hid!
Cause nothin's hid, from us kids!
You ain't foolin' nobody with the lights out!
Woohoo!(2x)
And the power's out in the heart of man,
take it from your heart put in your hand.
And there's something wrong in the heart of man,
Take it from your heart and put it in your hand!
(hand!)(the lights out!)(hand!)(right now!)(hand!) . * single do álbum Funeral (2004). .
sexta-feira, julho 28, 2006
Quando é que o rapaz muda de K7? Analogia de formatos/suportes.
Morrissey - The World Is Full Of Crashing Bores (Live)
. . The World Is Full Of Crashing Bores (live)
. You must be wondering how
The boy next door turned out
Have a care, but don't stare
Because he's still there
Lamenting policewomen policemen silly women taxmen - uniformed whores
They who wish to hurt you, work within the law
This world is full, oh oh, so full of crashing bores
And I must be one, 'cos no one ever turns to me to say:
Take me in your arms, take me in your arms, and love me
You must be wondering how
The boy next door turned out
Have a care, and say a prayer
Because he's still there
Lamenting policewomen policemen silly women taxmen - uniformed whores.
They who wish to screw you, work within the law
This world is full, oh oh, so full of crashing bores
And I must be one, cos no one ever turns to me to say:
Take me in your arms, take me in your arms
And love me, and love me
What really lies, beneath the constraints of my head
Could it be the sea, with fate mooning back at me
No it's just more lock jawed pop stars
Thicker than pig shit, nothing to convey
They're so scared to show intelligence
It might smear their lovely career
This world, I am afraid, is designed for crashing bores
I am not one, I am not one
You don't understand, you don't understand,
And yet you can take me in your arms and love me, love me and love me (...) . * do álbum You Are the Quarry (2004). .
quinta-feira, julho 27, 2006
Entre destroços... um vocábulo essencial
Rick Harrison, Kirkstall Abbey, Leeds (I.R.)
.
Perdido na decifração do seu mapa pessoal,
sem crenças esotéricas ou relação com o que se diz astral,
sem nenhuma paciência para exegetas que gizam
os humores de estrelas extintas há anos-luz...
Sem acesso directo ao bairro dos concílios familiares,
ocupado a tempo inteiro a desimpedir a via dos afectos,
descartada a hipótese de algum dia vir a resgatar
a morada antiga de entre os escombros numerados...
Resta-lhe respigar nos escolhos regressivos da memória,
o que porventura sobrou de um vocábulo essencial,
porém esquecido num léxico fatalmente mais restrito;
indagar com a frieza de um exame médico se perdas houve,
que tipo de reacção a pronúncia do longínquo verbo amar
nele ainda pode despoletar antes de prescrito o cautério.
.
Alteridade
I
Um fosso enorme entre mim e os outros:
intransponível - no qual volto a esbarrar
sempre que os nossos caminhos se cruzam.
II
Ninguém sabe ao certo
o que faz de si
o eleito de si próprio,
nem o que o distingue
do abismo
que é a alteridade.
É-se desconhecido de si
e do outro.
.
Mazzy Star - Fade into You
. .
You live your life, you go in shadow
Some kind of night into your darkness
quarta-feira, julho 26, 2006
O inquilino
(foto de Claudio Meier)
terça-feira, julho 25, 2006
Metric - Poster of a girl
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Poster of a girl
.
Can't stand by myself
Hate to sleep alone
Surprises always help
So I take somebody home
To find out how I feel
Feel like just a baby
Portrait of a lady
Poster of a girl
Je sais que tu n'aimes pas ta réalité
Tu sais que tu n'aimes pas ta réalité
Tu sais que je n'aime pas ma réalité
Je sais que tu n'aimes pas ta réalité
Tu sais que je n'aime pas ma réalité
On ne peut pas fabriquer la vérité
Tu sais que tu n'aimes pas ta réalité
Je sais que tu n'aimes pas ta réalité
Satisfy myself
Avoid beginners
Who long to shut my mouth
Till I take one of them home
'Cause I know how it feels
Filling in the blanks
Looking on the bright side
When there is no bright side
Coming in your pants
For the off chance
With a... poster of a girl
poster of a girl (4 x)
Je deteste dormir sans une présence
[ Les surprises semblent alléger ma solitude
Alors je ramène quelqu'un dans mon lit
Afin de découvrir comment je me sens
Comme un bébé
Portrait d'une femme ]*
Affiche d'une fille
Portrait d'une femme
Affiche d'une fille
Me satisfaire
Eviter les novices
Ceux qui cherchent à me faire taire
Jusqu'à ce que je rentre avec l'un d'eux
Car je connais la sensation
De chercher le fil d'or
[ Et de ne jamais le trouver
Coming in your pants
Qui ne pense qu'à coucher avec une
fille d'affiche
Affiche d'une fille
Une fille d'affiche ]*
Potrait d'une femme
Affiche d'une fille
Tu sais que tu n'aimes pas ta réalité
Je sais que tu n'aimes pas ta réalité
On ne peut pas fabriquer la vérité
Je sais que tu n'aimes pas ta réalité
Tu sais que tu n'aimes pas ta réalité
.
O caso hilariante do cegueta
Aparentar cansaço é uma coisa, dormir é outra completamente distinta. (uau! foi preciso arranjar um blog para escrever um frase desta categoria). Já dormir em pé raia os fenómenos de outro mundo ou para não ir tão longe (por especular com mundos longínquos é que a vida de Giordano Bruno neste mundo terreno foi "abreviada" à força...) teria potencial para figurar entre uns quantos números aberrantes numa feira de variedades em qualquer arrabalde de província. Pois bem... Não acham hilariantes as motivações (é certo que bem-intencionadas) de um míope severo que, confiando a tal ponto (não digo “cegamente”, para não abusar da ironia) na sua performance ocular, se sente na obrigação de acordar uma pobre moça que segundo a sua “óptica” (sou tão mauzinho...) lhe parece conseguir o feito de dormir em pé?! Isto então é de um universo paralelo, cuja explicação deixo para os astro-físicos.
(Mr. Magoo)
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Gágágáehihihgágáeheh
(Yoshimov, Shop)
(daqui)
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Perdi-os de vista e claro que não segui a rota de ambos para ver se o filhote lá conseguia debitar o “Descalça vai para a fonte...” Não sou assim tão cusco e quanto a mini-perseguições estamos conversados: fiquei-me apenas pela Miss Nice. Por acaso ainda ouço uma vozinha a sussurrar qualquer coisa como: “get a life!”. Dizia eu... apesar de não ser assim tão cusco, fiquei a matutar um pouco sobre o assunto (só um pouco porque a minha vida não é mesmo isto...) e se não encontrei respostas formulei perguntas q.b para quem quiser responder por mim. Eis algumas:
- relação mãe/filho ameaçada por falta de diálogo ou por se expressarem em idiomas diferentes?
- um caso precoce mas ainda assim ilustrativo do generation gap?
- mais um caso de pressão parental para que os filhos cumpram os altos desígnios que deles se esperam?
- terá sido aquele episódio a gota de água que a levou a dirigir-se à secção dos livros com a vã esperança de encontrar o “Descodificador dos Anjos e Demónios”?
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P.S. Atenção que não aceito um gágágáehihihgágáeheh como resposta! (data e hora da postagem original: 23/7/2006 - 16:05)
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Adenda:
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(daqui)
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Certamente que não vos passou despercebido o facto de se tratar da mesma criança nas três fotos. Urgia fazer desta feliz coincidência matéria conclusiva para este post.
Na 2ª foto: suponho que esteja a memorizar o "Descalça vai para a fonte...". Porque não um japonês a recitar Camões?!
Na 3ª foto: ostenta em letras garrafais e em caps lock uma das respostas possíveis (não direi que tendenciosa, ou que a versão da criança é suspeita de parcialidade, pois não creio que tenha havido tempo suficiente para ela apreender a arte da duplicidade, apanágio de idades mais tardias) que nenhum comentador ousou dar (não obstante os mui valorosos contributos que mui apreciei)...
.segunda-feira, julho 24, 2006
Angústia, antecessora da escolha
(Cláudio Roberto, Paranapiacaba encruzilhada)
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Ermo ou encruzilhada,
deserto que se bifurca
em profusão de rastos
por diferentes vias,
onde só por ilusão
os dilemas se mitigam.
Optar é interditar-se
o acesso a lugares:
miríficos? ilimitados?
É cingir-se à escolha
de uma miragem,
que depressa o tédio invade?...
Notas soltas sobre o concerto
Os Pixies não surpreenderam, mas também não ficaram aquém das expectativas. Deram o 4/5 de litro. Mas havia alturas em que parecia estar a rever o DVD. Como encore tocaram o “Here comes your man”. Um pouco à minha frente reparo que um rapaz ao beijar a namorada lhe dá a prova irrefutável disso mesmo.
Quanto ao pós-concerto, convém ser mais lacónico. O zumbido nos ouvidos a afectar certas zonas do cérebro suscitaram algumas variações em torno do nome Pixies: Pixels e Pickeles e Pisces (atenção que é um termo inglês...), etc. Seguiu-se uma semi-noitada no Bairro Alto, com pouco álcool e muitas deambulações por entre ruas....
domingo, julho 23, 2006
De Fábio H. L. Martins
sábado, julho 22, 2006
O “get a life” antes do concerto dos Pixies
(daqui)
Sentados, à espera do metro, comecei a cantarolar para a minha irmã – tadinha! - alguns dos refrões mais badalados dos Pixies. Ela deve ter julgado que eu pretendia estragar antecipadamente todas as expectativas que ela alimentara em relação ao concerto. Confiei que o volume de som estivesse devidamente ajustado para que apenas ela – pobre cobaia! - me conseguisse ouvir. E como é óbvio, confiei mal. Porque nisto passa uma rapariga que por instantes fixa os olhos em nós. Imagino que com um ar intrigado de quem se interroga “Será que é mesmo daqui que provêm estes grunhidos?”. Depois da confirmação que sim senhor eu era a fonte de poluição sonora, ela lá conseguiu (não sei como) seguir a sua rota sem aparentar grande constrangimento. Há pessoas com nervos de aço!
(daqui)
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dou-vos a oportunidade de embarcarem comigo nesta barca infernal que é a imaginação e remar em direcção (infelizmente para as nossas mentes, trata-se de uma via sem retorno) a uma das mais sacrílegas imagens mentais que em má hora concebi - a do Papa em underwear:
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Pronto, mais um anátema para a colecção! Este blogue já deve fazer parte dos excomungados... Repararam no contraste branco/preto e na largueza do underwear? Grrrrrh... spooky! Sobreviveram à jornada? O meu cérebro depois disto parece ter ficado com sérias sequelas. Paga-se mesmo caro uma tal afronta... e os danos reflectir-se-ão provavelmente em futuros posts. Adiante.
Esta nossa saga detectivesca veio mais ou menos no seguimento do que tínhamos estado a falar acerca do tema “Get a life!” (para os rapazes e o mundo L existe também a variante “get a wife!”). Em bom português o tema tem o seu correlativo: “Não tens vida própria?”. A expressão aplica-se a todos os súbditos do nefando império da coscuvilhice, aos acólitos dos reality shows e dos tablóidescos gossips, que da realidade só retêm mesmo o espectáculo e o fogo-fátuo.
sexta-feira, julho 21, 2006
Novelo sem saída
Alguém me diga que me chamo Teseu...
pois ainda não me reencontrei
no novelo de que sou feito,
nem ao menos a linha salvífica por que guie
o recomeço das minhas buscas, enredadas sempre
em despedidas reticentes às portas do labirinto,
que intuo percorrido de ponta a ponta
pela tua miragem, ó Ariadne...
E a cada passo atiças contra mim
os mastins vorazes do passado,
tu que em sonhos por mais do que uma vez
me estendes a promessa de um novelo:
vieste de novo com o fito de sofrer
emaranhando-me em renovada prova do teu amor?
E agora saber qual deles o mais longo
e mais longe me levará no mito?
Se desfiasse o amor que me dedicas agora,
cada metro de linha contaria uma velha história
tão velha que no mesmo beco desembocaria:
na fuga para a ilha do teu abandono.
Alguém me diga que me chamo Teseu,
pois ainda aqui ressoa que apenas ele,
em o minotauro vencendo, se não perdeu...
É tanto o desfiar nesta babilónia,
que temo descurar o que na passagem há de belo,
em prol de algo indefinível que nem sei por que anseio -
vaga ideia de pega varonil com um monstro de cornos
(dizes-me que sem saída
dizima o tributo anual,
mas não o voluntarioso que eu seria
se descobrisse o caminho para a arena central).
O labirinto estreitou-se, tornou-se ermo.
Cansado por longos anos de espera,
de refregas, Astérion partiu por fim;
legou-me o posto que dissiparei,
como de Ariadne o amor
em mim dissipei.
Sintonias
alguém esteja vertendo em verso
as mesmíssimas palavras que me afloram
mas que falho em dar-lhes
densidade corpórea.
Haveremos por certo de nos interpelar
e chegar a um consenso
que com idêntica precisão
sirva aos nossos intentos
de capturar o esquivo e quem sabe
o indizível,
divergindo apenas no percurso
(o que já é muito)
e no terreno a fecundar.
Nenhum de nós emitirá um só juízo, porém,
sobre as desmesuras acalentadas por ambos.
quinta-feira, julho 20, 2006
Noites & ausências
I
A noite segreda a quem queira escutar
a palavra silêncio – o arame farpado
que rasga a carne em ansiosa fuga
em desolado abandono das trincheiras
onde fantasias ainda por formular
são enterradas vivas por morteiros.
II
Todas as noites às mesmas horas,
despia-se a casa dos acessórios,
desprendiam-se os quadros, as fotos,
tudo quanto era lembrança atávica,
para os poupar aos obuses da memória
que implodem com tudo até na arrecadação,
aí onde a tinta colorida dos dias amolece,
e a pasta viciosa rescende a desejo de posse,
a nudez insatisfeita em banho de escórias.
III
As paredes arrimam-se abrindo alas
ao sonâmbulo de braços erectos ao alto,
bússola norteando o rumo das noites
pelo vazio das casas inabitadas.
IV
Do lume brando sob os dias
o cansaço que não é de um só corpo;
as lentas macerações da alma incensória
com as florescências do mundo,
num derradeiro e verdadeiro luto
pela noite descida a meia-haste.
V
Anseio pelo gesto mínimo
pelo estritamente necessário
para dobrar o cabo da hora.
VI
Faróis da viatura Noite, carreira devoluta,
feixes de contemplação nas bermas sinistradas.
Como vim parar a este beco?
Trocou-me as voltas a noite?...
VII
O mar encapelado ordenava na dianteira
a frente de assalto às fragas da tua ausência,
os peões de um jogo sem consequência
revoluteando nas cristas das ondas
os estandartes com as quinas da dúvida:
se a espuma dissolvida reverteria
para a tua pálida figura. .
quarta-feira, julho 19, 2006
Livros: inscrição na carne
terça-feira, julho 18, 2006
Banhos de mar
(tirado daqui)
Os adultos que molham lentamente os membros, como se de um ritual se tratasse: o de preparar o corpo para o mergulho. E quando por fim mergulham, afiguram-se-lhes incomensuráveis os instantes nesse mundo de profundezas e correntes, cujas leis lhes parecem estranhas.
Alguns corpos bóiam com total liberdade e lassidão à superfície do mar - um extenso espaço ondulante que parece ter vida própria -, como que embalados por uma mão que tivesse suspendido o tempo e tudo em seu redor.
Outros vêem formar-se as cristas de ondas prontas a despenharem-se sobre eles em fúria irreprimível. Desses, alguns ainda esbracejam inutilmente, mas acabam por se deixar levar nesse impulso quase primordial; outros são tragados num turbilhão de correntes instantâneas, para logo emergirem à superfície, inspirando sofregamente e sacudindo o seu espanto para longe.
sábado, julho 15, 2006
Crepúsculo nas dunas
O sol declinara e do seu leito rosado, um vasto lençol azul-escuro polvilhado de estrelas, descia lentamente sobre o céu. Deitado de costas sobre o areal, eu observava a transformação gradual que se operava na abóbada celeste, a subtileza com que os cenários diurnos e nocturnos se revezavam. No estado onírico em que me encontrava, e a que nesse dia particular me era possível predispor (dado que o meu espírito aparentava uma calma invulgar e parecia excepcionalmente ter-me decretado tréguas); assim imaginava que um espectáculo daquela envergadura, que a esplendorosa orquestração de mais um culminar diurno, teria forçosamente que ficar a dever-se ao esforço imenso despendido, dia após dia, por uma caterva de cenógrafos e aderecistas divinos. Mas com que finalidade? Para nosso simples deleite e fruição? Não, não podia ser apenas por isso... Ainda se se desse o caso de todos nós lhe darmos o devido valor. Mas o que é facto, é que tudo isso, tanta beleza (gratuita e mesmo assim desbaratada por tantos ingratos), na maior parte das vezes, nos passa irremediavelmente ao lado, tendo no máximo por recompensa um olhar fugaz e ausente num mundano regresso a casa. Desejava por isso acreditar que do último estrebuchar do dia, que dos seus derradeiros raios de luz, percutindo em pequenas ondas de calor, ainda retinisse um eco de esperança e de felicidade em muitos corações. Isto talvez por me sentir aflorado por quase inaudíveis ressonâncias, compósitas desse eco.
.
quinta-feira, julho 13, 2006
Sala de espera no meio do nada
Sorrimos um ao outro,
à linha que nos separa e que é tão ténue...
Contudo é mais fácil ceder à distância que se interpõe entre nós.
Prolongo a nossa ausência na extensão do descampado,
sonho na solidão desta vasta janela para o mundo.
Abarco com o olhar um cenário fictício de entrega,
mas os corpos quedam-se mudos, desprovidos de intenção,
sem um fulgor que desfie o emaranhado da espera feita torpor.
Um chiar de carris anuncia a despedida.
Nenhuma palavra veio selar o nosso estranho encontro.
Nenhum gesto meu deteve a tua partida...
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quarta-feira, julho 12, 2006
Corredor sem grades
(Chani Goering, Manikin - The Diminutive Form of a Man)
O teu corpo adeja por um corredor sem grades.
A gaiola é estreita, imperturbável.
De nada adianta apoiares todo o teu peso num dos seus extremos.
Rebelião alguma induzirá a menor racha nestas paredes,
nem as tuas oscilações converterão a sua estrutura num pêndulo desgovernado.
Devias dar graças ao facto da portinhola se abrir para ti todas as manhãs,
ainda que na sua aparente inexistência seja de imediato assimilada.
Sossega pois a um canto, enquanto a mão te renova a água e o alpiste.
Confina os teus desejos a esta rotina, e louva-a com um dos teus velhos gorjeios.
Perdeste o canto? A penugem sem cor põe-te triste?
Deixa lá... tens uma gaiola só tua.
Ah, por isso mesmo? Não tens por quem cantar?
Por quem manter o viço das penas?
Mas vá lá, trina ao menos para mim...
Que sou quem sempre te renova a água e o alpiste.
terça-feira, julho 11, 2006
Interioridades
De ambos os lados do caminho-de-ferro sucedem-se os canaviais. Assemelham-se a vigias nervosos baloiçando ao sabor da brisa ligeira ou baluartes ressequidos a demarcar um extenso território virgem. A intervenção humana neste lugar recôndito restringe-se à estreita linha-férrea, que começa a acusar os sinais do tempo. As reivindicações dos vários elementos naturais começaram a ser atendidas: ervas daninhas vencem aqui e ali a aridez do cascalho, as tábuas pregadas aos carris apodrecem e o brilho metálico cede à ferrugem baça.
So lone, so lone... baby, baby... *
* variante da letra original do grande tema "So long" de Perry Blake. Quem conhecer a melodia do refrão até pode cantarolar...
.segunda-feira, julho 10, 2006
Fish, temas piscícolas e saídas nocturnas
Uma constatação: em Leiria, pelo menos duas discotecas travam concorrência entre si até ao nível dos nomes. A exemplificá-lo temos a Fish e a Sushi - ambos os nomes reportam a temas piscícolas e têm ainda em comum o "sh", como se à entrada quisessem mandar calar a clientela e fazê-la entrar ordeiramente... Se foi essa a intenção, hão-de ganhar muitos clientes com esse feitio! À primeira vista, ou para ser mais exacto, à primeira audição os nomes piscícolas não me pareciam combinar lá muito bem com o espírito - os mais voluptuosos dirão carnalidade, mas não vamos entrar por essas velhas dicotomias... - do que é supostamente a night. Mas depois lembrei-me de algo que em tempos também um professor nos dizia (os profes ensinam-nos cada coisa...) e cheguei à conclusão que os nomes de temática piscícola assentam que nem uma luva nesses espaços de lazer. É claro que há nomes que assentam muito melhor, mas também não vamos por aí... O que dizia esse professor? Mais ou menos isto: que nas saídas nocturnas, havia uma arte que não se podia descurar (pelo menos ele não descurava) - a arte de lançar ardilosamente a rede, esperando numa feliz ocasião poder recolher alguns dividendos. Por outras palavras: onde há mar há peixe! Não faço ideia se ele era ou não um "pescador" bem sucedido. A mim soa-me um bocado primária a analogia pescaria/engate. Não que eu esteja a apelidar esse profe de "primário", atenção. Na prática (infelizmente, não na minha) confirma-se que a analogia até tem razão de ser. Brincadeiras à parte (se bem que quando se fala da night, as brincadeiras costumam ser a parte mais interessante), de resto em termos de ambiente e tipo de música, a Fish e a Sushi parecem estar quase nos antípodas uma da outra. Antípodas talvez seja exagero.
Focando-me na Fish... Funciona como bar/discoteca. Tem várias divisões que diferem entre si pelo tipo de música, ambiente, iluminação, disposição e tipo de cadeiras, sofás, etc... de modo a ir ao encontro de vários gostos, vontades, apetites e estados de espírito e/ou carnais (lá vem a velha dicotomia à baila). Gosto dessa variedade e de haver vários pontos de paragem à nossa escolha. Por exemplo, pode-se ir para uma ou mais divisões relativamente mais calmas para poder conversar (há até uma espécie de candelabros, quase à mesma altura das pessoas num determinado sofá, e que certamente já terão iluminado momentos muito especiais...) ou pode-se descer para o piso inferior e abanar o capacete ao som do house, numa pista de dança que só peca por ser relativamente pequena. Resultado: saímos de lá às 5 horas da manhã.* .
P.S. . Pode parecer, mas este post não me foi encomendado pela Fish... Não, não é um spot publicitário, é mesmo um post. * Estão à espera que eu divulgue os resultados da pescaria, não é? Pronto, ok. Vou ser sincero: nem sequer houve tentativa de lançar a rede. E por uns tempos acabaram-se as analogias. .