quinta-feira, fevereiro 07, 2008

Melancolia que estranhamente conforta

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Draconian, Where Lovers Mourn (2003)
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Ouço mal acordo. Ouço durante o dia. Durante a noite nem se fala. Ouço ao deitar e acho que até ouço a dormir, em sonhos. Ninguém percebe esta minha fixação. Paixão dir-se-ia. Ou quase ninguém.

Pois bem, é este, na minha humilde e modesta opinião, um álbum de estreia que roça a perfeição. Exagero? A culpa é destes suecos que não o fazem por menos. Gravadas algumas demos, invariavelmente insatisfeitos com os resultados, só avançaram para voos mais altos quando se sentiram com maturidade suficiente para lapidar o diamante que tinham em mãos. E, cada vez mais, é assim que deve ser, que este mundo não está para amadorismos e mostra-se cada vez menos condescendente no que toca a passos em falso (e se à nascença, pior).

O jogo de vozes à la "Beauty and the Beast", mais que um contraponto, é uma díade como as faces de uma moeda atirada ao ar, girando, girando. No geral, as vocalizações guturais de Anders Jacobsson, também poeta (o que até romantiza a aura "Beast"), não caiem nos excessos que em parte tipifica o death metal - o que para mim é ouro sobre azul (poderia dizer o mesmo, mas com cores ligeiramente mais negras). Na voz seráfica de Lisa Johansson, ó riacho de águas cristalinas, encontro a doçura que conforta após a tempestade. Mas não se pense que este é um álbum de cataclismos: estamos sobretudo no domínio do doom. Em face disto, escorrem de cada faixa gotas da mais prostrante melancolia e os riffs de guitarra parecem reinventar a linguagem do lamento. O doom metal, não poucas vezes, é um último abraço aos condenados da vida. Daqueles que se despedem, se apagam ao fundo do túnel e afinal voltam, recriando um ciclo.

Quero ainda salientar (vamos lá etiquetar o post) a rica apropriação de elementos folk, faixas com pontuações e acentuações certeiras de guitarras acústicas, violino e piano; as arrebatadoras distorções nos terrenos do rock progressivo (piscadela de olho aos Opeth?).

Sim, há por aqui muita dor, muita renúncia, renegação, sensação de perda e vazio, amores perdidos, anjos caídos e idos, mas momentos igualmente luminosos que transcendem a palete dos cinzas, as cores do negrume. Melancolia que estranhamente conforta. E sim há conteúdo, há lirismo, poesia para quem se dê ao trabalho de a procurar. Sob a capa da dureza e de uma mais que enganosa aridez fui sendo guiado por entre tesouros e acredito que outros também o poderão ser.
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16 Comentários:


Blogger hazey jane disse...

vejo-te bem a ouvir de manhã, à tarde, à noite, a dormir... e até te vjo com a guitarra electrica no anexo a tirar isto muito rápido e a participares o mais completamente possível, sem faltar nada no teu universo musical. imagino a redenção. acertei?

07/02/08, 13:00  

Blogger Cláudio disse...

Parece que escrevi isto sob efeito de narcóticos. Cada vez menos me vejo capaz de escrever sob uma forma que não seja o panegírico. Se calhar acham-me excessivo, uma mente delirante que facilmente sucumbe ao fascínio da descoberta do novo, como quem se maravilha frente aos abismos do desconhecido, frente a vales encantados. Não me importo. Gozo mais assim :)

Tirando o facto de estar limitado a três cordas apenas, imaginas bem. Estrelinha, até parece que me conheces :)

07/02/08, 15:03  

Blogger hazey jane disse...

dá-me narcóticos desses. eu gosto de te ler assim, como gosto de te ler sempre, como sabes...
gosto que não te importes, principalmente. que gostes...

três cordas, ainda? rapaz, investe...

08/02/08, 00:12  

Blogger Cláudio disse...

Algumas destas transacções, inadvertidamente, lá vêem a luz do dia. Mas há que ter cuidado com a cedência de narcóticos... :)
Tenho de investir mesmo. Sinto os dedos estão cada vez menos calejados ;) e esta via de expressão a atrofiar-se.
Agradeço-te tanto a companhia, o olhar e a atenção que dedicas às minhas palavras. Sabes que é recíproco, não sabes? Beijinho, Estrelinha.

08/02/08, 15:39  

Blogger hazey jane disse...

e com três cordas apenas...


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sabes que eu e a papelinha entrámos em mui injusta combinação (para ela) e gostava muito de fazer umas revisões contigo.

08/02/08, 15:54  

Blogger Cláudio disse...

:) Mas se foste tu que me ensinaste os primeiros acordes, lembras-te? Até pareceria mal vir agora o aluno armar-se em chico-esperto :)

08/02/08, 16:00  

Blogger hazey jane disse...

má vontade a tua...
sabes bem que ainda estou nos primeiros acordes...

08/02/08, 16:02  

Blogger Cláudio disse...

Hmm, vamos lá ver. Quem dera a muitos estar ao nível dos teus primeiros acordes... Mas se quiseres, dentro das minhas parcas capacidades e abundantes limitações, ensino-te o "Over Now" dos Alice in Chains. Acho que ias fazer boa figura frente à Papelinha :)

08/02/08, 16:10  

Blogger Cláudio disse...

Ensino-te, não. Mostro-te. :) Vês no que dá o chico-espertismo... Dá-se-lhe confiança e depois é isto...

08/02/08, 16:16  

Blogger pin gente disse...

tentei claúdio, tentei mesmo!
os meus ouvidos não estão habituados... a voz feminina agradou-me, bem como a melodia de fundo (bem de fundo).
abraço
luísa

08/02/08, 16:50  

Blogger Cláudio disse...

Pingente, fico contente pela tua tentativa :) E mais contente ainda porque no fundo no fundo até houve coisas que te agradaram. Abraçinho.

08/02/08, 17:06  

Blogger Maria P. disse...

Ouvi, gostei à minha maneira.
Vou saíndo com um sorriso...:)
Beijinho*

08/02/08, 19:18  

Blogger verdades_e_poesia disse...

Sim senhor. Apesar de eu não ser um adicto inveterado destas sonoridades, garanto-te que estas me caíram bem. Nota-se à distância que tem qualidade. Procurarei as letras para ver a poesia que delas emana. Agora esse teu diálogo com a Estrelinha tem todo o sentido de humor... E foi ela enviar-te a morada da loja de música. (Boa estrelinha) lol De facto se fores à tal loja, os senhores até são bem capazes de te colocar as cordas de borla, com a crise que por aí anda... Eu, por mim, com a velha viola acústica, que me preenche um pequeno espaço da sala, já fiz semelhante avaria. :)
Agora te digo, em relação ao texto, que gostei claro! E mais te digo que uma coisa temos nós em comum - a música 'devora-nos' a alma. Abraço

08/02/08, 20:42  

Blogger hazey jane disse...

queria achar-te excessivo, uma mente delirante que facilmente sucumbe ao fascínio da descoberta do novo, como quem se maravilha frente aos abismos do desconhecido, frente a vales encantados. arranja-se por aí?
;)

09/02/08, 20:51  

Blogger Cláudio disse...

Maria P., sair daqui com um sorriso já é muito bom... É que não costumo dar muitas oportunidades a que isso aconteça ;)

Verdades, fico contente por te terem caído bem, por teres-lhes dado uma oportunidade.
No geral acho que existe um preconceito quanto a este tipo de sonoridades. Mas nada como dar-lhe primeiro a atenção devida e depois sim julgar. Ninguém é obrigado a gostar, claro. Mas julgar sem conhecer isso acho feio.
Quanto às moradas: ela fez o favor de as deixar aqui, bem visíveis, porque ela sabe bem o quão comodista eu sou (ou posso ser). Pois, nada lisonjeiro, mas é assim. :)
Temos isso em comum, temos. Música e eu devoramo-nos. Mutuamente. Não sou muito pelas relações assimétricas. Gosto da lei de Newton, a do par acção-reacção.
Abraço.

Estrelinha, os meus excessos guardo-os nos rascunhos que estão lá muito bem ;) Além do mais, mentes excessivas encontram-se em toda a parte. É o que não falta no mundo dos blogues :)

11/02/08, 17:23  

Blogger Maria P. disse...

Não é verdade!:)

11/02/08, 23:23  

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